Jorge Leal: um militante resgatado pela família

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Nessa página você conhecerá um pouco mais sobre quem foi o ativista Jorge Leal, da Ação Popular (AP), referência da entrevista com a viúva, Ana Neri, em conape notícias nº 15 (nov-dez/2013)

Na entrevista ao conape notícias, edição 15 (nov-dez/2013, a anistiada Ana Neri sintetizava com emoção o significado do reconhecimento do Estado pelo desaparecimento do petroleiro e ativista político baiano Jorge Leal Gonçalves Pereira, na década de 1970, durante a ditadura militar: “A anistia política chegou como uma homenagem a Jorge. É o reconhecimento de que ele teve um papel importante, inclusive na Petrobrás”.

Nesta edição de conape notícias falaremos mais sobre quem foi Jorge Leal, pois na edição 15 centramos na anistiada (post mortem) Ana Neri, que não só conseguiu o reconhecimento do Estado pela morte de seu esposo como anistiou Jorge e ela própria, em 2008. Isso foi possível com a contribuição da Conape e seus advogados Cláudia Dalla Costa e Wilson Souza de Carvalho – também anistiado político.

A maioria dos dados aqui coletivizados constam da Ação Jurídica de Anistia Política elaborada pelos citados advogados, bem como pelas palavras de Ana Neri e da obra de Dom Paulo Evaristo Arns, “Tortura Nunca Mais” (9ª edição, Editora Vozes). Para saber outros dados sobre Jorge Leal consulte o conape notícias 15.

Jorge Leal, embora jovem (décadas 1960/70), foi um militante político muito experiente e destacado, na Bahia e posteriormente no Rio de Janeiro, onde desapareceu nos porões da ditadura – foi visto pela última vez no temido Batalhão da Polícia do Exército, na Barão de Mesquita, no Rio. Estudou na Escola Politécnica da Universidade da Bahia, onde passou a atuar no movimento estudantil como membro da Juventude Universitária Católica (JUC), de Salvador (BA).

Jorge Leal foi um ativista dedicado, fiel e disciplinado que, em 1968, foi atuar no interior da Bahia como forma de ampliar a presença de sua organização junto aos camponeses – era uma tática maoista de revolução do campo para a cidade.

Em 1979, em plena vigência do AI-5 e da repressão, no Governo Emílio Garrastazu Médici, passou a atuar clandestinamente no Rio de Janeiro [então Estado da Guanabara], como forma de sua organização atuar num importante centro do país, sobretudo naquela época.

“A presença do anistiando nesta lista macabra por si só seria suficiente para o reconhecimento oficial do Estado Brasileiro da sua condição de anistiado político dada a sua destacada atuação político-ideológica”. (Comissão de Anistia)

Ele passou muitas dificuldades de obter recursos, em função da radicalização naquele período que o demitiu da Petrobrás, onde trabalhava como engenheiro pleno – de 6/1/1963 a 1/10/1964. Seus modestos recursos vinham do trabalho profissional na Ação Popular (AP), que ajudou a fundar, em 1962, e na qual atuou até ser preso pela ditadura.

O desaparecimento e a anistia

Em 21/10/1970, Jorge Leal saiu de seu lar para mais um dia de militância política para nunca mais voltar. A Ação Judicial da Conape destacava: “É evidente que o seu não retorno, não foi ato voluntário, pai amoroso e idealista, não deixaria jamais, como até então nunca tinha deixado, sua família ao léu. Ele, como tantos outros militantes, foi vítima do arbítrio, da violência do Regime de Exceção reinante à época, que se outorgava o direito de sequestrar, torturar, prender e matar ao arrepio de qualquer processo legal”.

O nome e alguns dados sobre Jorge Leal figuram da lista “Nomes de Pessoas Desaparecidas (com a época do desaparecimento)”, Anexo I, da obra “Tortura Nunca Mais”. Constam a data e local de nascimento [25 de dezembro de 1938, Salvador, Bahia]; seus pais [Enéas Gonçalves Pereira e Rosa Leal Gonçalves Pereira]; e o ano do desaparecimento, 1970.

Na entrevista ao Conape Notícias nº 15, Ana Neri ressaltou que este registro no “Tortura Nunca Mais” é, em si, um atestado de óbito. Tal dado confortou a família por algum tempo, mas as conquistas principais vieram com muita luta – reconhecimento do Estado pela morte, bem como a anistia politica. Quando do Requerimento de Anistia Política (post mortem), a Comissão de Anistia (do Ministério da Justiça) ressaltou que o Estado assumiu sua responsabilidade pelos mortos relacionados na Lei Federal 9.140/95, na qual se encontrava Jorge Leal. Registraram também no Requerimento de Anistia, uma longa lista de eventos e diversos dossiês produzidos pela ditadura nos quais se encontrava o nome de Jorge Leal Gonçalves Pereira.

E sublinhou a Comissão de Anistia (Ministério da Justiça), entre tantas outras referências comprobatórias da atuação política de Jorge Leal: “A presença do anistiando nesta lista macabra por si só seria suficiente para o reconhecimento oficial do Estado Brasileiro da sua condição de anistiado político dada a sua destacada atuação político-ideológica”.

Em suma, nos diversos termos do seu Requerimento da Comissão de Anistia, favorável ao casal Jorge Leal e Ana Neri, bem como os seus quatro filhos que juntos com a mãe, cumpriram uma dura e honrosa jornada pela anistia política e pela responsabilização do Estado de Exceção por ter tirado um jovem engenheiro da Petrobrás e um bravo ativista da vida política nacional, simplesmente por pensar diferente, por não concordar com o arbítrio e por querer um país democrático e mais justo. Fica mais uma breve e importante história sobre um Brasil que não queremos mais. Assim, é importantíssimo resgatar tais memórias.

Jorge Leal consta (foto grifada com “x”, pela família) do destaque de página do jornal “Em Tempo”, década de 1960.

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A Ação Popular (AP) surgiu em 1962, após um congresso da esquerda católica. Lutava pelo socialismo humanista… (Fábio Pires Gavião, autor da dissertação “A esquerda católica e a Ação Popular (AP) na luta pelas reformas sociais – 1960-1965”)

Porque é importante resgatar a memória?

Para não alongar, basta citar uma frase do Frei Betto (ou Carlos Alberto Libânio de Christo), uma das principais lideranças da Igreja Católica no Brasil que atuou bravamente contra a ditadura (1964-1985): “É muita ingenuidade nossa pensar que tudo acabou”. Betto ficou preso no período 1969 e 1974, acusado de integrar a Ação Popular (AP) ao lado do guerrilheiro Carlos Maringuella. Betto disse (texto amplamente divulgado na internet) estar convencido de que os militares ainda agem nos bastidores do Planalto espionando as mais altas autoridades do país, inclusive a Presidência da República.

Texto: José Moutinho/Conape Notícias nº 16 (jan-fev/2014)

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