Nos dias 26 e 27 de agosto, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), da Câmara dos Deputados, realizou o seminário “Anistia 40 anos: Amarga Espera”, para fazer memória dos 40 anos de promulgação da Lei de Anistia 6.683/1979.
Caravanas de anistiados e anistiandos políticos partiram de diversos estados para o encontro que lotou o auditório Nereu Ramos, na Câmara dos Deputados. A mobilização foi organizada pela Astape-RJ, Sindipetro-RJ, FNP, ABCP/Campinas/SP, Abraspet-BA, Associação dos Militares Anistiados (Ampla), Unidade de Mobilização Nacional pela Anistia (UMNA), Associação Brasileira de Anistiados Políticos (ABAP), Associação dos Anistiados e Aposentados e Funcionários dos Correios e Telégrafos do Estado de São Paulo (Aacetesp), Associação Tortura Nunca Mais, seccionais da OAB, entre outras representações.
Estiveram presentes, pela Conape, Idinéa Nicacio da Silva (3º vice-presidente), o diretor Xerxes Affonso Campos e a diretora executiva Cláudia Dalla Costa.
Pela Astape-RJ: Genobre Gomes Lima (presidente), Luiz Carlos Martins de Souza (1º secretário), Adelino Ribeiro Chaves (diretor), entre outros diretores e conselheiros. Pela Abraspet-BA: Raimundo Lopes (presidente), Antonio Valente Barbosa (vice-presidente), Luciano Monteiro Campos (1º secretário), Antonio Gomes Trigueiros (2º secretário), entre outros diretores e conselheiros. Pelo Sindipetro-RJ e a FNP tiveram presentes os diretores Fabíola Mônica, Clarckson Nascimento, entre outros.
O seminário contou diversos parlamentares, personalidades, lideranças de anistiados e dos movimentos sociais. Todos carregavam a marca de ter sofrido (direta ou indiretamente) pela perseguição política desferida pela ditadura civil militar implantada em 1964.
Com uma farta programação (palestras, debates, testemunhos, filmes, entre outros), os palestrantes e expositores apresentaram suas reivindicações sobre anistias que ainda não foram concedidas. No dia 26, foi realizada a Sessão Solene e no dia 27 o seminário em si, com os painéis: “Justiça de Transição e Direitos Humanos” e “Greve como Referência para a Anistia”.
O público que lotou o auditório teve ativa participação, com perguntas, muitas palavras de ordem contra o governo federal; contra a atual formação da atual Comissão de Anistia (Ministério da Justiça), tem militares ligados à União; repúdio também à ministra Damares Alves (Mulher, da Família e dos Direitos Humanos); contra as reformas da Previdência, Trabalhista; contra as privatizações de empresas estatais; os incêndios na Amazônia, entre outras questões candentes da conjuntura.
Amarga espera
Um tema que teve um detido debate foi a greve como ato político. Foi demonstrado que o governo (para se furtar de conceder anistias políticas pendentes) tem insistido em não reconhecer a greve como ato político. Para tal, tem restringido os movimentos grevistas a atos por reivindicações trabalhistas e não movimentos políticos pelo fim da ditadura e redemocratização do país.
Amarga espera, também, por centenas de anistias pendentes de publicação (reconhecimento) pela Comissão de Anistia (Ministério da Justiça), bem como pela angústia causada pela reforma da Previdência.
Sessão Solene
O seminário teve início com a Sessão Solene, em 26 de agosto, que foi presidida pelo deputado federal Vicentinho; com participação da deputada federal Erika Kokay; do ex-deputado federal Nilmário Miranda; de Saulo Gomes, vice-presidente da Associação Brasileira de Anistiados Políticos (ABAP); Luciano Monteiro Campos, 1º secretário da Abraspet-BA; João Paulo de Oliveira, presidente da Associação de Anistiados dos Metalúrgicos do ABC-AMA; Cléria Runk da Silva, 1ª presidente da Associação Brasileira de Anistiados Políticos (ABAP); Rosa Cimiana dos Santos, representante nacional dos anistiados e anistiadas políticos.
Em seu discurso, o deputado Vicentinho disse aos anistiados e anistiandos, que lotaram o plenário da Câmara dos Deputados: “Vocês simbolizam o verdadeiro herói e a verdadeira heroína. Vocês perderam entes queridos para garantir um direito sagrado, que é a democracia nesse país. E nós não podemos, em hipótese nenhuma, vacilar na luta pelo estado democrático de direitos. Vocês merecem uma salva de palmas”.
O ex-deputado Nilmário Miranda fez um resgate da campanha “Anistia política, ampla, geral e irrestrita”, debaixo do regime ditatorial. Falou sobre o papel de diversas lideranças políticas, como Teotônio Vilela, entre outras. Mas lembrou, também, a ambiguidade da Lei da Anistia, que anistiou perseguidos e perseguidores.
“Nós perdemos e ganhamos ao mesmo tempo. Ganhamos porque tínhamos 15 mil brasileiros exilados, milhares viviam na clandestinidade, e milhares tinham passado por toda sorte de perseguição e viviam lutando como era possível”, destacou Nilmário.
Disse que, embora a anistia tenha demorado um pouco (só ocorreu na década 1980), “abriu as prisões da ditadura ”. “A anistia sempre trouxe essa dupla história – de derrota e de vitória”.
A Lei de Anistia, completou Nilmário, teve um fato muito ruim ao ignorar a existência de mortos e desaparecidos políticos no país. “Não se podia falar em tortura, nem em mortos e desaparecidos”. Esta luta continua.
Resgatou, também, que a Lei de Anistia passou a reconhecer, em 2001, o direito à anistia aos milhares de civis e militares perseguidos, nos mais diversos setores, inclusive em empresas estatais.
Rosa Cimiana dos Santos alertou para o fato da atual Comissão de Anistia ser composta por militares que tratam os anistiados e anistiandos como “terroristas”. Convidou aos presentes que compareçam aos julgamentos para atestar tal situação, “e combatê-la”.
O capitão José Wilson Silva (Ampla) disse que “a anistia é uma questão de Estado. Logo, o Estado reconhece que agiu mal”, “passou por cima da Constituição e de todas as leis”.
Também sublinhou que a Lei de Anistia favorecer aos perseguidores, bem como vem sendo mal cumprida. “Há requerimentos, de 2001, que ainda não foram apreciados”.
A deputada Erika Kokay disse ao público: “Cada um de vocês que estão aqui também são signos de resistência, que a gente vai tecendo, tecendo, tecendo para que nós possamos devolver uma democracia que está aprisionada, no pelourinho, que está marcada, que está ferida, e que é fruto de um golpe continuado em 2016”.
Luciano Monteiro Campos também criticou a atual composição da Comissão de Anistia. “A atual composição têm conselheiros ligados ao ‘patronato’ (a União) e não publicam nenhuma portaria pela concessão de anistia. São empregados da União julgando a União. É o maior dos absurdos. A Comissão é uma farsa”.
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Textos e fotos: José Carlos Moutinho (jornalista), e imagens de vídeo da Câmara dos Deputados.