Acadêmico e lutador social internacionalista que conquistou a anistia com muita garra
Ele começou cedo sua militância política; aos 15 de idade integrava o PCB. É acadêmico, petroleiro e lutador social internacionalista. O anistiado Antonio Trigueiros falou um pouco de sua história ao conape notícias
Em 1961, o jovem professor baiano de matemática e futuro petroleiro, Antonio Trigueiros, se encontrava na cidade de Santo Amaro da Purificação (BA), próximo à Refinaria de Mataripe.
O destino colocou no caminho de Trigueiros o sindicalista Mário Lima, então presidente do Sindicato dos Petroleiros da Bahia, que recomendou ao jovem matemático a almejar trabalho na Petrobrás, notadamente na refinaria.
No final de 1962, Lima havia informado a Trigueiros que naquela refinaria tinha uma média de 300 trabalhadores analfabetos, oriundos das plantações de cana-de-açúcar. Logo, uma excelente experiência para o jovem professor.
Motivado por Mário Lima, o professor Trigueiros começou a batalhar uma oportunidade na refinaria, na qual havia um projeto de alfabetização, mas que ainda não tinha conquistado a simpatia dos trabalhadores. Por diversas razões, ele ainda não conseguira trabalho no projeto. Forte razão: o então chefe do Centro de Treinamento era o arquiteto Temístocles Batista, ligado aos golpistas que se reuniam na 6ª Região Militar para apoiar o golpe de 1964.
Em dezembro de 1962, faz um teste para auxiliar de manutenção, na refinaria. Neste período, o golpe civil-militar estava em andamento. Na refinaria já se encontravam diversas pessoas (técnicos, engenheiros e administradores) trabalhando em favor dos golpistas (da 6ª Região Militar, em Salvador).
Antonio Trigueiros disse que recebeu uma carta sobre sua aprovação para trabalhar na refinaria e que deveria se apresentar em 5/1/1963. Quando compareceu, foi informado por Temístocles Batista que tinha havido um engano em relação à sua aprovação. Trigueiros atribuiu esta mudança de posição (o alegado engano) ao fato dos golpistas terem descoberto sua ligação com o Partido Comunista Brasileiro (PCB).
A saída foi Trigueiros ser contratado como auxiliar de manutenção, mas estando à disposição do Centro de Treinamento. O cargo de professor foi adiado e Trigueiros trabalhou na manutenção, até que veio o golpe de 1964 e interrompeu suas atividades na Petrobrás.
Jovem ativista político
Aos 15 anos de idade, Trigueiros tinha se filiado ao PCB, em Santo Amaro da Purificação. Com 16 anos de idade foi residir em Salvador, onde fez o Curso Científico – hoje o Segundo Grau. Antes de ingressar na Petrobrás, ele trabalhou como operador de material numa metalúrgica, em Salvador.
Nas atividades de militante político, ele ficou responsável em estabelecer contatos com o Centro Popular de Cultura (CPC), da UNE, que desenvolveu inúmeras atividades que tinham como foco o contraponto (resistência) ao regime no campo da cultura. O CPC fez várias atividades na Refinaria de Mataripe, sob a coordenação de Trigueiros.
Perseguição política
Com o golpe de 1964, ele e outros trabalhadores da Petrobrás ficaram presos numa cela da Polícia do Exército, na Bahia. Demais petroleiros foram distribuídos para prisões num navio da Marinha, no 19ª Batalhão de Caçadores do Exército, entre outras prisões.
Em dezembro de 1964, Trigueiros foi demitido da Petrobrás. Disse que sofreu agressões e lembrou os nomes de petroleiros que foram barbaramente torturados pela ditadura: Vivaldo das Neves, Emanuel do Rego (ex-presidente da Conape), Milton Oliveira e Carlos Brondi. Trigueiros disse que o autor das torturas foi o Capitão Abreu, do Exército.
Ele, além de perder seu emprego na Petrobrás, foi demitido do Centro Educacional Teodoro Sampaio (ensino público), em Santo Amaro da Purificação, onde lecionava matemática. Ou seja, perdeu suas duas importantes fontes de sobrevivência.
Em 1965, passou no vestibular para Geologia, não obstante estar com problemas de saúde física (operou as amigdalas etc.) e psicológica, por conta das perseguições do regime de exceção. No entanto, com esforço, prosseguiu em suas atividades políticas no PCB, onde ajudou a organizar o Centro Estudantil Universitário (CEU).
Idas e vindas
Ainda em 1965, por sugestão de um companheiro de PCB, foi para o Rio de Janeiro e organizou sua ida para a Europa e prosseguir nos estudos. Inicialmente, pensou em estudar na Romênia, que tinha uma excelente escola de Geologia, mas não foi possível. Assim, foi para a Bulgária, em dezembro de 1966, onde conseguiu bolsa para física atômica. Concluiu o referido curso, fez mestrado e um ano de idiomas, concluindo tudo em fevereiro de 1974.
Estando na Suécia, Trigueiros manifestou desejo de voltar para o Brasil. Trocou correspondência com sua irmã para tratar do assunto. Ela o informou que situação no Brasil estava muito complicada, pois a ditadura estava no seu auge de repressão e prisões (do governo Garrastazu Médici). Ela informou que diversos militantes tinham sido condenados a prisão e que ele [Trigueiros] tinha uma condenação de dois anos de prisão. Logo, o mais aconselhável era permanecer na Europa.
Participou da Federação dos Estudantes Latino-americanos na Bulgária, onde foi presidente. Na Suécia, também participou de várias atividades de movimentos sociais, fundou um jornal, entre outras atividades.
Em 1981, ele voltou ao país, por conta da anistia política iniciada em 1979. Tratou de assuntos relativos à anistia e retornou à Suécia, onde trabalhava e tinha constituído família. Em janeiro de 1986, mudou-se definitivamente para o Brasil e foi trabalhar (por 12 anos) no Instituto de Física da Universidade de Campinas (Unicamp), após doutorar-se em Física Atômica, na Suécia.
Por três anos, trabalhou na Universidade Federal Fluminense (UFF) e na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) por quatro anos. Voltou para a Suécia.
Recentemente, em função de ter perdido sua esposa, que sofreu do Mal de Alzheimer, interrompeu suas atividades profissionais na Suécia e está programando seu retorno definitivo para Salvador (BA). No Brasil, pretende concluir um livro técnico sobre combustão e estabelecer contatos com ex-alunos da UFF e Unicamp.
Anistia
O processo de anistia foi muito demorado para ele, em função de problemas com documentação. O petroleiro teve seu nome incluído numa lista da Comissão de Anistia (Ministério da Justiça), sendo anistiado. Mas em função da Refinaria de Mataripe ter confundido o processo, a anistia foi revogada. Ela informara que ele não teve vínculo empregatício na Petrobrás. Trigueiros explicou que as suas documentações comprobatórias na petrolífera haviam desaparecido por obra do citado chefe do Centro de Treinamento, Temístocles Batista, no período da ditadura.
Finalmente, sua anistia foi concedida no Governo Fernando Henrique, por conta de um novo processo aberto. Mas foi muito trabalhoso, pois teve que buscar e reunir uma série de provas, inclusive documentos de inquéritos do Exército, onde constava seu nome como um dos dez mais procurados. Na Agência Nacional de Inteligência (Abin), ele conseguiu uma grande quantidade de registros sobre suas atividades políticas, desde Santo Amaro da Purificação (antes e depois do golpe), na Europa, entre tantas outras.
Conseguiu derrubar a falsa alegação de que ele não tinha vínculo empregatício na Petrobrás. Outras fortes provas: a declaração de sua sindicalização pelo Sindicato dos Petroleiros da Bahia (só podia ser sindicalizado quem fosse empregado da petrolífera estatal); e o dentista da Refinaria de Mataripe, que confirmou o vínculo de Trigueiros. Portanto, com muita luta conseguiu sua anistia.
Disse que se associou à Conape, pois viu a entidade contribuiu para o avanço de muitos processos de anistia dos petroleiros. Também é filiado à Abraspet (Associação Brasileira dos Anistiados Políticos do Sistema Petrobrás e demais Empresas Estatais), em Salvador.
Texto e foto: José Moutinho/Conape Notícia nº 17 (mar-abr/2014)