Aloisio Simões: na Reduc, ajudou a livrar petroleiros de serem presos pela ditadura militar

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Como muito destacou em diversos momentos da entrevista, ele se dava bem com todo mundo na Reduc/Petrobrás, dos sindicalistas aos dirigentes da refinaria, num dos períodos mais negros do país. Com acesso privilegiado aos gabinetes, o anistiado e motorista Aloisio Simões, conseguia descobrir as manobras dos militares e livrava as lideranças da prisão.

O anistiado Aloisio Simões nasceu em 19 de fevereiro de 1932, no bairro da Penha, Zona Norte no Rio de Janeiro, portanto, “carioca da gema”. Caminhoneiro desde a juventude, Simões, em 1962, foi contratado pela Refinaria Duque de Caxias (Reduc), sendo lotado no Setor de Transportes. Inaugurada em 1961, com apenas seis unidades e 13 km², a Reduc estava em fase avançada de construção quando Aloisio foi contratado. Antes da Petrobrás, ele foi motorista da Coca-Cola, onde fez amizade com Wilson Marinho Conde, que também foi motorista da multinacional de refrigerantes e depois foi ser Inspetor de Transportes da Reduc.

Numa oportunidade, em 1962, Aloisio foi fazer uma entrega da Coca-Cola, na Reduc. Ele viu seu ex-colega de Coca-Cola, Wilson Conde, na refinaria e dirigiu-se a ele. Após conversarem, Conde incentivou o Aloisio a se candidatar para trabalhar na refinaria. “Eu dirigia desde o Aterro do Flamengo ao Mercado São Sebastião, na Penha”, disse Aloisio sobre sua experiência antes de ingressar na Reduc.

Um parêntese. Hoje aos 82, Aloisio mora no bairro de Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio, numa aprazível rua, bem arborizada. Ele e sua esposa Dilma, receberam (carinhosamente) o conselheiro da Conape, Newton Menezes; o gerente administrativo da entidade, Armindo Miguel Filho; e o jornalista José Carlos Moutinho. Muito simpático e sorridente, ele esforçou-se bastante para driblar as falhas de memória, durante a entrevista ao Conape Notícias. No entanto, respondia todas as perguntas com muita simpatia e satisfação. Por várias vezes enfatizou como fez muitas amizades na Reduc, das quais se destaca Wilson Conde, muitas vezes citado. “Eu me dava bem como todo mundo”, reforçava em diversos momentos.

Voltando ao assunto contratação de Aloisio pela Reduc. “O Conde olhou para mim e disse: ‘o que você está fazendo aqui [Reduc, em Duque de Caxias]? […] Você não quer trabalhar aqui? ’”. Aloisio respondeu positivamente. “Aí ele chamou o Chefe dos Transportes, o Iedo Brun. Depois fiz uma prova e fui aprovado para trabalhar na Reduc, em 1962”.

Disse que deu muito duro na Reduc, pois a refinaria estava em construção, o que exigia o transporte de muitos materiais de construção, pedras, entulhos, entre outros. Menezes lembrou que o Setor de Transportes chegou a pertencer ao Departamento Serviços Gerais, que posteriormente foi chefiado por Abelardo Rosa Santos, anistiado e o atual presidente da Conape.

“Eu era o único que sabia onde o Kleber estava escondido, pois era o único que levava comida, café, documentos para ele lá no ‘Inferninho’ [um depósito nos fundos da Reduc]”

Aloisio lembrou da sua aproximação com o Sindicato dos Petroleiros de Duque de Caxias, e que passou a colaborar como motorista do sindicato, em horas vagas. Sublinhou, também, que foi muito próximo dos petroleiros e sindicalistas Aristélio Travassos [Contabilidade da Reduc] e Kleber Batista de Souza [Operação], ou “Kleber Papagaio”, assim apelidado pelos companheiros em função de ele ter sido muito falante.

O fato dele se dar bem com todo mundo, como sempre ressaltava, contribuiu muito para ajudar os companheiros num dos momentos mais negros vividos pelos petroleiros na Reduc, a partir de 1964 com a ditadura militar. Os militares estavam perseguindo todos os ativistas e Aloisio contribuiu para proteger, por exemplo, o Kleber Papagaio. “Eu era o único que sabia onde o Kleber estava escondido, pois era o único que levava comida, café, documentos para ele lá no ‘Inferninho’ [um depósito de materiais velhos, num lugar ermo da Reduc]”.

Aloisio sublinhou que o Wilson Conde não se dava bem com os petroleiros ativistas, pois era um integralista. No entanto, “tinha comigo uma amizade como se fosse de pai para filho. Ele era muito mais velho do que eu. […] Nunca me denunciou, embora tenha denunciado outros”.

Além do Kleber, o Aloisio conseguiu levar Aristélio e sua família para a casa de um amigo deste último. Também disse ter levado comida, entre outras coisas, para o Aristélio.

Após ser descoberta sua proximidade com as lideranças de petroleiros, em 1964, Aloisio foi demitido da Petrobrás. Ele disse que demorou a ser descoberto pela ditadura, como colaborador dos sindicalistas, pois trabalhava em regime de turno, tendo pouca visibilidade para os apoiadores do regime.

Um “espião” do bem

O gerente administrativo da Conape, Armindo Filho, teve convivência pretérita com Aloisio Simões, quando este frequentava regularmente a Conape.

Armindo lembrou que Aloisio trabalhou diretamente no gabinete de um coronel, na Petrobrás, e prestava atenção quando o militar falava ao telefone. Assim, Aloisio conseguia captar informações importantes e repassá-las para as lideranças, como Aristélio e Kleber Papagaio, escondidos nos fundos da Reduc (ou no “inferninho”, como nomeavam). Aloisio foi como um “espião” da resistência à ditadura.

Lembrou que numa determinada oportunidade, Aloisio descobriu que o militar soube sobre um dos esconderijos do Kleber e tinha dado ordem de irem buscá-lo. Imediatamente Aloisio dirigiu uma Pick-Up e foi avisar o Kleber para deixar o local. “No entardecer daquele dia, Aloisio pediu ao Kleber para pegar tudo que tinha, pois os militares estavam indo prendê-lo. Fizeram rapidamente uma trouxa de roupas necessárias e jogaram pela janela, em direção ao Aloisio, que a colocou no Jeep”.

Disse que foi tudo muito rápido, por pouco Kleber e sua família seriam presos. Por poucos minutos foram salvos pelo Aloisio. Quando este retirava Kleber e seus familiares num Jeep, minutos depois chegou uma viatura com militares, que arrombaram a casa, mas não havia mais ninguém para prender. Eles observavam, a poucos metros de distância, o movimento dos militares.

Após os militares terem abandonado o local, Aloisio levou Kleber Papagaio e família para um novo local. Assim fazia nosso entrevistado quando trabalhava no Setor de Transportes da Reduc, ou seja, ficava sempre atento às manobras dos militares para prender os sindicalistas e avisava, rapidamente, estes últimos. Com isto conseguiu livrá-los da prisão, entre outras consequências com a ditadura. Para o novo esconderijo, Aloisio conseguiu levar outras lideranças, entre eles José de Sá Cavalcanti.

Armindo destacou que Aloisio era um frequentador assíduo da Conape. “Ele vinha aqui quase que semanalmente. Ele foi suplente de conselheiro e vinha muito aqui, até um dia ele sofreu um acidente grave (que quase tirou sua vida) numa esteira ergométrica. […] Esse acidente prejudicou a memória dele. Se eles [os fisioterapeutas] não tivessem uma clínica médica no local, não teriam tido tempo de salvar Aloisio”.

Newton Menezes lembrou de um fato curioso (e trágico) na vida de Kleber Papagaio. “O Kleber teve uma contradição. Por ele ser muito falante, e foi chamado de Papagaio, acabou tendo um câncer de laringe, e emudeceu”. Kleber faleceu em 15/01/2013. Em outra oportunidade, na década de 1960, Kleber salvou Aloisio numa explosão ocorrida na Reduc.

Texto e foto: José Moutinho/Conape Notícias nº 20 (set-out/2014)

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